
A roda solar é uma evolução maior do símbolo solar primitivo, que é
o círculo. Os dois eixos sobrepostos formando os quatro pontos cardeais
formam, assim, a base de todos os símbolos de orientação. É a mesma
coisa que uma bússola marcando o Norte em sua parte superior. Mas bem
antes da invenção da bússola, este símbolo solar estava presente em
todas as culturas europeias, principalmente na Idade do Bronze. Essa
época distante nos deixou, entre outras coisas, as numerosas rochas
gravadas na Escandinávia, cobertas destas rodas solares. Encontramos
também um grande número delas na tradição Celta, embora outras culturas
pagãs ao redor do mundo tenham usado este símbolo. Mas antes de
adentrarmos nos mistérios da roda solar, vejamos antes alguns aspectos
ligados à própria noção de orientação. A orientação implica três
elementos de base: a localização do sujeito está marcada pelo ponto
central; a orientação no espaço marcada segundo os pontos cardeais
terrestres Leste e Oeste, que designam o amanhecer e o pôr do Sol; a
orientação marcada segundo os pontos cardeais do eixo Norte e Sul. A
roda solar veicula uma verdadeira síntese da orientação em todos os
sentidos.
Não só nos orienta no espaço, mas também no tempo do curso do ano
solar, já que esta roda sagrada é um símbolo do movimento vital. Sem
movimento não há vida, é o movimento cíclico que marca nossas
festividades pagãs mais importantes, como os solstícios de inverno e
verão, os equinócios de outono e primavera. Estas festas não foram
meramente agrícolas, mas tiveram um carácter altamente religioso para
nossos ancestrais politeístas.
O solstício de inverno, deformado pelo Cristianismo, se transformou
na festa do Natal. Esta data marca o momento do ano no qual a Natureza
recupera sua respiração, abrindo, assim, as portas do novo ano, depois
de um período de 12 noites sagradas. Os dias se fazem mais largos,
permitindo, assim, a chegada de dias melhores e o retorno do Sol. Os
Romanos celebravam o culto ao Deus solar Mitra, entre outros, este
renascia a cada ano em 25 de Dezembro como filho do Sol. Se designou
essa data como a de Sol Invictus, o “sol invencível”. Pouco antes, os
Romanos celebravam a Saturnália, momento quando era costume dar
presentes. Este período se acabava com a festa e culto ao deus Janus, o
deus bicéfalo que leva uma chave nas mãos. Este deus deu seu nome ao mês
de Janeiro, sendo este que abre e fecha as portas do novo ano solar.
Esta época do ano estava tão arraiada em todas as culturas pagãs da
Europa que o Cristianismo só pôde acabar com ela integrando-a em seu
calendário ao final do século IV, colocando na mesma data o nascimento
de Cristo para substituir e excluir a lembrança do Sol Invictus.
O equinócio da primavera marca o retorno dos dias bonitos e quentes, é
o período do ano dedicado à fertilidade e ao amor. A vegetação volta a
crescer de novo e os demónios do inverno são expulsos, a promessa de
campos férteis enche os corações das pessoas, as flores inundam com
milhares de flores os campos, os casais se formam e se unem graças ao
encanto mágico da primavera. Tudo cresce. É a celebração do renascer da
vida após a pausa invernal. Os Germânicos rendiam culto a Ostara, também
chamada Eostre, deusa que deu seu nome à festa de Páscoa (
Ēostre,
quem está por trás do nome da Páscoa em inglês: Easter). Naquele
período, nos quais os dias e as noites eram de mesma duração, era
evidentemente a ocasião para celebrar a união do Pai-Céu e a Mãe-Terra,
união que, nove meses mais tarde, durante o solstício de inverno, dará a
luz ao Sol Invictus, filho do sol.
O solstício de verão é o momento no qual o sol se encontra em seu
apogeu, marcando, para nossos ancestrais, um instante mágico durante o
qual as forças solares estão ao máximo de suas capacidades. A natureza
resplandece com força e com inigualável claridade. O verão traz consigo
calor, alegria e abundância, elementos que ainda hoje encantam os
veraneantes em busca da felicidade. Mas o solstício é um momento
paradoxal do ano, já que no mesmo instante em que o Sol se encontra em
seu ponto culminante, momento da vitória das forças solares sobre as do
escuro inverno, o Sol anuncia já o destino inevitável de sua carreira
cíclica e do declive que o espera. Os dias, pouco a pouco, começaram a
ficar mais curtos, a luz diurna tomara o caminho do Crepúsculo dos
Deuses. Para os Germânicos, era costume incendiar grandes rodas solares e
lançá-las morros abaixo, o que simbolizava o aspecto fecundante do Sol e
seu declive anunciado. Muitos rituais têm representado e continuam
representando o Solstício de Verão. Nos países bálticos, onde o
paganismo ainda segue vivo, o Solstício de Verão é uma autêntica festa
nacional, as pessoas usam coroas feitas com folhas de carvalho, que
simbolizam o Sol sagrado, dançam e cantam ao redor das fogueiras. Estas
fogueiras se encontram por toda a Europa, onde os povos celebram a
alegria do dia mais largo do ano. Os bailes em círculo, assim como as
fogueiras, são hinos simbólicos ao Sol. O Cristianismo tentou também
desviar e absorver o sentido destas festas, fazendo dela a festa de São
João. Essas festas de São João têm, desde algumas décadas, tendências a
voltar a suas verdadeiras raízes: pagãs. Um caso observável são Les Focs
de la San Joan na Catalúnia do Norte. Esta festa não está ligada a
nenhum santo cristão, e sim ao Deus Solar de todas as tradições pagãs da
Europa: Apolo para os gregos, Belenos/Lugh para os celtas, Baldur na
tradição germano-nórdica, Abelio para os celtiberos, Dazbog para os
eslavos. Ainda que deva ser notado que, para os celtas, as 4 festas
maiores não coincidem com as festas dos demais povos europeus, o que as
vezes gera confusão.
A quarta festa é o equinócio de outono, que também é paradoxal.
Marca, por um lado, a abundância, já que é o momento de agradecer aos
deuses pelas boas colheitas, mas por outro lado, esta festa marca o
declive do Sol em sua carreira cíclica. A abundância nesta festa se
encontra na Erntedankfest alemã, onde se agradece aos deuses pelas boas
colheitas. Neste caso, o véu cristão é muito fino e é necessário de
pouco para encontrar a origem real da celebração. Quando o sol
enfraquece, só é necessário observar a Natureza para nos dar conta que
os dias se fazem mais curtos, que as rosas caem das árvores, que o frio
se faz sentir e que muitas plantas morrem. A morte está na esquina, é a
época na qual as portas do além se abrem e se teme a todos os espectros.
No mito europeu da Caça Selvagem, o deus Wotan cavalga Sleipnir
contornando o céu do outono acompanhado de todos os guerreiros mortos em
combate. Mas a morte não é definitiva, já que um velho dito pagão diz
que é necessário morrer para renascer, como uma árvore que morre só em
aparência, para renascer na seguinte primavera.
A este nível do nosso estudo, acabamos uma volta completa da nossa roda solar.
Esta roda solar esconde outro princípio fundamental que foi estudado
pelo grande filósofo Heidegger. É o princípio do Ser e do Tempo (no
sentido do tempo que passa). O eixo horizontal do símbolo representa o
Tempo, ou seja, tudo o que muda, tudo o que é submetido aos caprichos do
destino. O aspecto material está incluso neste eixo. Uma expressão do
Tempo é, por exemplo, o corpo físico que nasce, cresce e finalmente
desaparece. Enquanto o eixo vertical representa o Ser, o aspecto eterno e
imutável, a força espiritual que emana de toda a vida. Mas ao contrário
dos monoteísmos que separam as noções de corpo e espírito, a sabedoria
pagã se reflecte no simbolismo da Roda Solar, demonstrando que o Tempo e o
Ser são dois conceitos inseparáveis.
Segundo as explicações admitidas, o eixo horizontal seria de natureza
feminina, enquanto o eixo vertical seria de natureza masculina. A
imagem desse simbolismo é de carácter bastante sexual e está de acordo
com outros símbolos relacionados aos eixos da roda solar que vimos aqui
em cima (imagem).
As quatro extremidades da Roda Solar nos conectam com o simbolismo do
número 4, intimamente ligado à Terra. O círculo representa o Sol e o 4, a
Terra. Temos este código numérico uma vez mais na presença da união do
Sol com a Terra.
Precisamos dizer que este símbolo é comummente chamado de “cruz
celta”, palavra que deveria ser empregada com prudência por várias
razões:
– Este símbolo não é unicamente celta, e como já foi dito, se encontra
em todas as culturas pagãs da Europa e em algumas fora dela.
– A cruz celta é uma evolução cristã da Roda Solar, na qual os eixos
ultrapassam o círculo para acabar assemelhando-se à crucificação cristã,
neste caso a simbologia pagã e cristã se misturaram.
Para concluir, podemos dizer que este símbolo milenar engloba todos
os aspectos ligados aos ciclos solares, ao eterno retorno, ao ritmo
natural dos elementos celestes em equilíbrio com os elementos terrestres
e a harmonia perfeita entre todas as forças que regem o cosmos. É um
hino à glória do Sol.
Link original: Symboles Païens et inscriptions runiques