Talábriga
Origens
À chegada dos romanos, o litoral a norte do Tejo era ocupado
pelos túrdulos, povo cuja cultura era essencialmente mediterrânica. Tal como no
sul, mais efectivamente colonizado por gregos e cartagineses, também aqui o
espaço se organizava em torno de cidades. Talábriga era a que ficava mais ao
norte, já na região do Vouga. A sobrevivência de um substrato mais antigo, de
raiz indo-europeia, documenta-se no sufixo briga, que significava
'povoação fortificada'. Para o interior e para o norte o espaço era ocupado por
povos com uma cultura mais primitiva, de tipo castrejo e pastoril e
predominantemente de matriz indo-europeia.
Estação Arqueológica (agora parcialmente destruída pela tempestade de 19-01-2013)
Referências históricas
Plínio-o-Velho, autor latino do século I d.C., refere Talábriga ao descrever o litoral da Lusitânia:
"A Durio Lusitania incipit: Turduli veteres, Pæsuri, flumen Vagia, oppidum Talabrica, oppidum et flumen Aeminium, oppida Conimbrica, Collipo, Eburobritium […]" |
Segundo Pompónio Mela, a citada cadeia pliniana de cidades, iniciada no Vouga e que se prolongava até ao Tejo, pertencia aos Túrdulos (Turdolorumque oppida). A criação e delimitação do território (civitas) romano de Talábriga remonta à época de Augusto. Com efeito, em 4-5 d.C., sendo Q. Articuleio Régulo governador da Lusitânia, foram colocados marcos de fronteira em vários territórios. Dois desse marcos foram encontrados na fronteira de Talábriga, um em Ul (Oliveira de Azeméis) e outro em Guardão (Tondela).
O facto de o topónimo Talabriga ser de origem pré-romana leva a crer que este povoado já existiria quando a Lusitânia foi integrada no império romano. Curiosamente, Apiano de Alexandria, autor do século II d.C., descreve um episódio de resistência heróica à invasão romana passado num Talabriga oppidum em 138 a.C.. Existia, no entanto, outra povoação chamada Talabriga na região do Lima. Assim, embora a utilização da palavra oppidum favoreça a hipótese de o referido episódio se ter passado na Talabriga do Vouga (Plínio apenas refere oppida a partir do Vouga para sul, estando a região a norte dominada pela cultura castreja), a verdade é que não se pode saber ao certo a qual das cidades homónimas se referia Apiano.
Talábriga na Guerra Lusitana
Depois de expulsar os cartagineses da Hispania, os romanos
esboçaram, no início do século II aC., as primeiras intenções de criação de uma
administração provincial. Em 197 aC., foram criadas as duas províncias:
Hispania Ulterior (a ocidente) e Hispania Citerior (a oriente). Assim se
criavam as condições para um mais efectivo controlo e exploração do território
dominado. Os excessos da dominação rapidamente levaram a protestos e revoltas
dos povos indígenas.
As fontes registam confrontos entre romanos e lusitanos a partir de 194 aC.
Em 155 aC., depois de um período de alguma paz, estalou a chamada "guerra
lusitana". A morte de Viriato em 139 aC. foi um rude golpe sofrido pelos
lusitanos, prenuncio da vitória romana que pouco mais demoraria a consumar-se.
Em 138 aC., Décimo Júnio Bruto, nesse ano encarregado do governo da Hispânia
Ulterior, empreendeu uma grande campanha militar que se estendeu a todo o
actual território português, e que marcará, verdadeiramente, o fim da guerra
lusitana. Sabe-se que, durante esta campanha, Bruto fortificou Olisipo
(Lisboa). Talábriga é a única cidade que se sabe por testemunhos escritos ter
oferecido grande resistência à campanha de Bruto. Veja-se o que escreveu Apiano de Alexandria: "Entre outras cidades que se rebelaram foi Talábriga a que mais vezes o fez. Brutus, voltando ali, os habitantes da cidade pediram-lhe clemencia e confiaram-se ao seu arbítrio. Em primeiro lugar mandou que lhe entregassem os transfugas dos romanos, os prisioneiros e todas as armas, além dos reféns; depois ordenou que saíssem da cidade com mulheres e filhos. Logo que acabaram de o fazer, cercou-os de tropas e arengou-os, dizendo-lhes que quantas vezes se rebelassem, tantas vezes mais violentamente a guerra lhes seria feita. Amedrontados e convencidos de que mais asperamenente se vingaria deles, Brutus acalmou-os contentando-se só com estas recriminações. Tomou-lhes os cavalos, mantimentos, dinheiro público e mais apetrechos bélicos, restituindo-lhes depois a cidade, o que eles já não esperavam. Depois de tantos feitos, Brutus voltou a Roma".
A localização de Talábriga no Marnel
Sendo de 70.5 milhas a distancia em linha recta entre
Coimbra e Gaia, não poderá estar correcta a distancia de 71 milhas atribuída
pelo Itinerário de Antonino ao percurso entre Eminio e Cale (aliás, a
distância tradicional por estrada entre Coimbra e Gaia ronda as 78 milhas).
Nesse caso, deve atribuir-se maior importância ao testemunho de Plínio, que
obriga a situar Talábriga a sul do Vouga. O sítio arqueológico romano mais
importante entre o rio Vouga e Coimbra é o castelo do Marnel, situado no alto
de um monte encravado entre os rios Vouga e Marnel. Aqui deveria ficar
Talábriga.
Vestígios romanos no Marnel
A configuração do castelo do Marnel apresenta dois terraços,
correspondentes aos dois pontos culminantes do monte: o Cabeço Redondo, ou
Cabeço de Vouga propriamente dito, a ocidente, e o Cabeço da Mina, a oriente.
Especialmente na vertente norte, os terraços encontram-se circundados por dois
outros terraços, em planos inferiores. Em todos os níveis, os terraços terminam
em taludes de cerca de quatro metros de altura que, originalmente, deveriam
estar, ao menos em parte, revestidos de muralhas. Destas apareceram vestígios a
sul e ocidente. No terraço do Cabeço Redondo foram encontrados vários restos de
construções, alinhadas de sudoeste a nordeste, ao longo de uma rua que ligava
duas portas da fortificação. É provável que todo este aparato defensivo seja
medieval, tendo pertencido à Civitas Marnel. No Cabeço da Mina existe
uma cisterna onde apareceram moedas romanas. Na encosta oriental do Cabeço da
Mina, prolongando-se até às areias do Marnel, foram encontrados restos de
cerâmica, grande quantidade de mós manuárias, bem como pedras aparelhadas e
capitéis. As escavações realizadas por Rocha Madaíl em 1941 revelaram, entre
outras construções, um sistema de muralhas de formato quadrangular, implantado
no Cabeço da Mina, que poderão ser o resto do fórum de Talábriga.
Desde 1996, a Câmara Municipal de Águeda tem vindo a fazer
escavações neste local. Estas escavações revelaram uma grande quantidade de
cerâmica comum da época romana, alguma sigillata e ainda metais,
nomeadamente fragmentos de peças trabalhadas em bronze, e vidros. Embora os resultados
das escavações realizadas nos últimos quatro anos não estejam ainda publicados,
parece que até agora não se encontrou nada que revolucionasse os conhecimentos
sobre este local.
Estação arqueológica do Cabeço do Vouga
Ao longo do século XX, generalizou-se a todo o monte do Marnel, ou Monte Reguengo, a designação de Cabeço do Vouga que, tradicionalmente se aplicava apenas ao Cabeço Redondo e excluia o Cabeço da Mina. Apesar dos esclarecimentos de Sousa Baptista, é frequentemente no sentido mais lacto que o topónimo Cabeço do Vouga é hoje entendido.
A chamada "Estação Arqueológica de Cabeço do Vouga" foi classificada como Imóvel de Interesse Público por decreto nº 36383, DG 147, de 28/06/1947, c/ rectificação no DG 170, de 25/07/1947. Veja-se a página sobre esta estação no Inventário do Património Arquitectónico da Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais.
O Território de Talábriga
Analisando a distribuição dos marcos de fronteira e dos
marcos miliários até agora encontrados, é possível reconstituir o território de
Talábriga. Verifica-se que coincidia em boa parte com a medieval terra de
Vouga, cuja sede era precisamente a civitas Marnel. Também isto
parece ser um forte argumento a favor da localização de Talábriga no Marnel.
O território de Talábriga devia extender-se do rio Antuã até à Mealhada e do
mar até às faldas serranas. Neste território se situam as modernas sedes
concelhias de Águeda, Albergaria-a-Velha, Anadia, Aveiro, Ílhavo, Mealhada,
Oliveira do Bairro, Sever do Vouga e Vagos.Fontes: http://pt.wikipedia.org/wiki/Talabriga
Para uma listagem de referências bibliográficas, consulte a página sobre a historiografia de Talábriga.
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